Parto então da hipótese de que são quatro as motivações mais frequentes entre os indivíduos que hoje optam por integrar uma iniciativa coletiva auto-organizada, dentro de um sistema não linear:
- O desejo por estabelecer relações de trabalho horizontais e eficientes. Os indivíduos que se auto-organizam com essa premissa consideram os modelos tradicionais, baseados em sistemas hierárquicos e na retenção do saber, insatisfatórios, insuficientes e/ou inválidos.
- A dependência de órgãos, instituições e políticas públicas para projetar, produzir, desenvolver, aprimorar e/ou difundir seu trabalho. Os indivíduos que compartilham desta motivação, por um motivo ou outro, estão insatisfeitos com os serviços oferecidos pelo poder público e compartilham da crença de que é possível preencher as lacunas, percebidas dentro de um contexto específico, através da iniciativa auto-organizada de um grupo de indivíduos, mesmo que esta iniciativa dependa, de alguma forma, de recursos públicos.
- A busca pela autonomia. As pessoas que se auto-organizam com esta finalidade pretendem dar vazão aos seus interesses, intenções e desejos dentro de um ambiente regido por um conjunto de valores e regras próprias, compartilhadas pelo coletivo.
- A insatisfação diante do sistema ou lógica sócioeconômica instaurada. Os que se auto-organizam por esta razão, em geral entendem que o sistema capitalista neoliberal instaurado fracassou e buscam outros modelos que materializem ideologias e visões políticas não contempladas. Organizações com motivações político-ideológicas se caracterizam como zonas de resistência e, frequentemente, buscam gerar tensão ou mesmo implodir o sistema; seguem regimentos próprios e almejam a justiça social e o compartilhamento dos saberes.
No caso dos que se auto-organizam em torno da arte – foco desta pesquisa – acredito que, frequentemente, as quatro motivações possam estar presentes, em doses diferentes, caso a caso. Para além das motivações ou necessidades pragmáticas e genéricas, há um campo de força específico que envolve a arte – intrínseco à ela, de natureza não reativa –, alimentado e movido pelo impulso dos que a praticam, de criar, reflexionar e propor. Ao mesmo tempo, o agente da arte é impelido a se auto-organizar para atender ao impulso, este campo de força; tonificado pela coletividade, ele alimenta e abraça o presente e o futuro das iniciativas auto-organizadas para a arte.